Crítica | Hereditário (2018)


- De: Ari Aster
- Com: Toni Collette, Milly Shapiro, Gabriel Byrne
- 2h07min
O resultado desta narrativa poderosa apoiada sobretudo numa interpretação provocadora de Toni Collette é simplesmente fascinante porque deixa espaço para discussão, para refletir e sobretudo deixa a sua semente como um autêntico pesadelo.

O terror nos dias de hoje é provavelmente o género com maior potencial de se renovar e oferecer histórias mais fortes e provocadoras, sobretudo no nicho mais independente, em que cada vez mais realizadores procuram desafiar as normas e convenções da indústria cinematográfica mais comercial. Hereditário é, para todos os efeitos, um produto desta euforia no género, ao mesmo tempo que serve de homenagem ao terror mais clássico e profundo, que há muito não se via em sala. É um filme que oferece um retrato perturbador e peculiar sobre uma família envolta numa maré de azares, sempre num tom obscuro e dramático, que sabe brincar com os seus pequenos detalhes e tirar partido das interpretações poderosas do elenco, sobretudo a de Toni Collette que me deixou sem palavras.
A forma com as personagens se relacionam, envoltas numa atmosfera familiar conturbada motiva discussões e momentos de uma intensidade capaz de provocar o espectador. São os conflitos familiares que oferecem a este filme um tom mais sério e profundo, digno de análise, sobretudo a relação mãe-filho que se assume sempre com um carácter algo misterioso e vai adquirindo confrontos cada vez mais obscuros. Há algo neste drama intenso que nos traz de volta a memória a possessão de Regan n’ O Exorcista ou o drama familiar de O Senhor Babadook, talvez pela forma como as personagens e as peripécias nos afectam, deixando-nos à deriva do medo real.

Este é um filme de terror para gente crescida, quase desprovido de sustos, em que o medo provém das peripécias chocantes e do seu tom dramático e obscuro. É um filme que trata o espiritismo de forma diferente da habitual, mais séria e ofuscada nos problemas que se vão adensando. As personagens memoráveis, um tanto ou quanto complicadas e as sequências que durante muitos anos irão estar presentes na memória, não só pelo aspecto chocante e perturbador mas pela forma como introduzem tensão no filme, sem forçar sustos despropositados tornam assim Hereditário numa experiência cativante e assustadora.
E o resultado desta narrativa poderosa apoiada sobretudo numa interpretação provocadora de Toni Collette é simplesmente fascinante porque deixa espaço para discussão, para refletir e sobretudo deixa a sua semente como um autêntico pesadelo, colocando as nossas emoções à flor da pele ao mesmo tempo que nos deixa completamente entregues ao drama real e familiar que se adensa com o desenrolar da história.